Mono, Estéreo, 5.1, 7.1… Faz alguma diferença?

Tive a ideia para esse post a partir de um livro que estou lendo sobre a reprodução fonográfica de alta fidelidade. Achei interessante que, logo no início do livro, o autor lista os modos de reprodução através da diferenciação de canais. Ele divide nas 3 principais que existiam na época para a música: estéreo, mono e quadrofônico (que ele defende que deveria se chamar “tetrafônico” para não se misturar a raiz em latim com a raiz em grego).

Uma das coisas que ele defende e que é incorreto é que o estéreo é o modo “padrão” porque tem dois canais, o que faz sentido se pensarmos que temos dois ouvidos. Isso não é verdade. Os nossos ouvidos são capazes de perceber a direcionalidade do som de diversas fontes diferentes, vindas de diversos ângulos diferentes. Se uma sala estiver com 50 pessoas ao seu redor e cada uma delas falar algo, você vai perceber de onde está vindo aquele som. Portanto, se uma sala também tiver 50 canais, a diferenciação e tridimensionalidade do palco sonoro gerado será bem maior do que em 2 canais. Entretanto, apesar de termos a capacidade de percebermos essas múltiplas direcionalidades, fico com a questão: será que estamos sabendo usar esse tipo de diferenciação de canais?
Para começar, vamos falar do mono. O mono tem apenas um único canal. Entretanto, a maior parte das gravações do mundo são mono. Quando um repórter fala na TV, aquele microfone é mono. Quando um técnico de som grava num set de filmagem, muitas vezes a gravação é feita de modo mono, especialmente se pode-se atribuir uma faixa de saída para cada microfone utilizado. Quando você manda um áudio no whatsapp, essa gravação é mono. O autor do livro que me referi acima coloca o mono como ultrapassado na reprodução, mas a verdade é que o mono é a raiz de tudo.
Mesmo na reprodução, usamos o mono o tempo todo. Quando uma televisão está ligada ou você escuta um áudio no alto-falante do seu celular, você está escutando de forma mono: As caixas de som estão proximas demais dentro da maioria das TVs e celulares e, por mais que estejam reproduzindo o áudio de forma estéreo, você não consegue perceber de forma estéreo. Você consome boa parte do áudio de forma mono. Quando que você consome de uma boa forma estéreo? Ao utilizar fones de ouvido.
Os fones fazem uma ótima separação de canais. Os falantes também estão muito próximos (às vezes mais próximos que os falantes de uma televisão), mas eles estão na sua cabeça, então proporcionalmente eles soam distante. Com isso, um som estéreo é bem mais fácil de perceber a diferença em um fone que em caixas de som em geral, a não ser que essas caixas de som estejam bem posicionadas e um ambiente pensado para elas ou tenham mais de 2 canais. Aí a história muda de figura.
Os fones de ouvido 5.1, 7.1 (ou como queiram chamar) são basicamente uma forma esquisita de fone de ouvido que considero defeituoso. Mesmo que o fone esteja sendo alimentado com um sinal puramente 5.1 ou 7.1, não há como negar que a distância entre os falantes dentro do fone de ouvido é minúscula. Pode-se ouvir a diferença de direcionalidade, mas todos virão de um mesmo lado. Usando o exemplo que dei lá no começo, pegando uma sala com 50 pessoas, é como se os falantes de um fone desses fossem duas pessoas que estivessem uma ao lado da outra e não em pontos diferentes na sala. Com isso, esse tipo de fone de ouvido jamais conseguiria emular o que um sistemas de caixas de som consegue. Além disso, eles correm o sério risco de prejudicar o som interno do fone, por terem diversos falantes dentro de uma mesma concha e isso poder criar problemas de fase entre os sons desses falantes. Mas se falarmos de caixas de som, aí é outra história.
As caixas de som de multi-canais tem a capacidade de situar o espectador no espaço. O problema é saber como utilizá-las. No caso do cinema, a atenção sempre tem que estar voltada para a tela. Se a masterização de som colocar sons que chamem muita atenção (como vozes) nos canais traseiros da sala, isso pode desviar a atenção do espectador da tela, causando um problema sério de imersão, ao invés de ajudar. O cinema já teve sua fase de ser um lugar de novidade tecnológica no fim do século XIX. Hoje em dia o cinema é um lugar de construir narrativas e criar imersão. E essa é uma tarefa dificílima.
Hoje a maior parte das salas de cinema tem pelo menos uma reprodução de som em 5.1  e a cada ano que passa as masterizações para 5.1 ficam cada vez mais interessantes e sabem usar mais o espaço da sala de cinema. O problema é que o cinema vem diminuindo de público a cada ano que passa e o público (e o dinheiro) tem se direcionado mais para a reprodução de filmes em casa, através da internet. Em casa, é difícil poder dedicar um cômodo para uma reprodução sonora em 5.1. Sim, porque não adianta querer colocar as caixas num espaço de 2m², não vai trazer a diferenciação de canais de uma sala de cinema (nem próximo, na verdade). Se você puder organizar um espaço para organizar o seu áudio em uma sala, ótimo. Se não, é bem provável que você vá optar por uma organização estéreo.
Como o mundo é muito barulhento e talvez você queira se livrar do barulho ou mesmo não fazer o barulho, é bem possível também que você opte por assistir o seu filme de forma estéreo com fones de ouvido em vez de caixas de som. A não ser que você não esteja assistindo sozinho. Se esse for o caso e você estiver assistindo com caixas de som, indico que você afaste as caixas de som pelo menos dois metros uma da outra. Como existem sons que estão sendo reproduzidos nas caixas de som, mas de formas diferentes, você vai conseguir perceber diferentes direcionalidades do estéreo, mas todas elas virão do espaço entre as caixas de som. Se você afastar as caixas, esse espaço aumenta.
Entretanto, às vezes você não tem essa opção. As caixas têm que ficar bem perto e a sensação estereofônica se vai. Mas isso não necessariamente estraga o filme ou a música. Na verdade, hoje em dia, muitas das caixas de som vendidas (como essas boombox da JBL) são, na prática, mono. Por mais que elas tem dois ou mais falantes, eles estão muito perto e normalmente quem escuta não está com o nariz colado no meio da caixa. Com isso, não se percebe a diferença de canais. Podemos dizer que começamos no mono, fomos para o estéreo, chegamos à reprodução de canais, mas de certa forma ainda aceitamos muito bem o mono. Isso me faz pensar que a audiofilia vai muito além da direcionalidade.
Não é apenas a capacidade tecnológica de reprodução que define a qualidade de um som. Desenho sonoro vai muito além disso .Acho que esse é um ponto central que não deve ser ignorado, mas o mais importante não é a tecnologia em si, mas sim como ela é utilizada. De fato, filmes como Star Wars e Avatar souberam utilizar muito bem o som espacializado para a sua narrativa. Filmes de ficção científica e fantasia normalmente têm um histórico melhor com o uso do 5.1 ou do 7.1. Mas, no fim das contas, o que realmente importa é a simplicidade de chegar ao ponto onde se quer chegar, de saber guiar o espectador. E isso a maioria das obras não soube fazer. Portanto, infelizmente, para maioria das obras, o som estéreo é mais que o suficiente.

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